Se existe um som (sim, é música para os nossos ouvidos) que causa arrepios em praticamente todos os entusiastas de carros preparados, é o do funcionamento de um motor sobrealimentado enchendo a turbina e virando o ponteiro do conta-giros para o outro lado. E se tiver uma válvula de prioridade para "espirrar", melhor ainda.
Partindo do esporte a motor e passando pelas ruas ao longo das décadas, o turbo deixou de ser um equipamento à parte (instalado pelos proprietários após os carros saírem das concessionárias) para se tornar versão de fábrica de motorização de inúmeros modelos, em diversos seguimentos. Entre os carros populares, podemos citar o impacto que a Fiat causou em 1994, ao lançar o Uno 1.4 Turbo, e Volkswagen no ano de 2001, com o Gol/Parati Geração III 1.0 16v.
Mas antes disso, quem queria ter um carro nacional turboalimentado precisava recorrer às preparadoras que não tinham vínculo oficial com as fábricas, o que significava realizar uma alteração drástica na mecânica e a perda da garantia de fábrica.
De olho nisso, a IHI Turbo, gigante japonesa na fabricação de turbocompressores, tomou a iniciativa, através da Ishikawajima do Brasil, de lançar no mercado nacional o kit Ishi Turbo, que continha filtro de ar, carburador, coletor de admissão, coletor de escape, sistema completo de escapamento, embreagem, distribuidor, junta de cabeçote, calços de inox para redução da taxa de compressão.
Esses kits eram vendidos como opcional em concessionárias Ford, como a tradicional Souza Ramos (SP), para modelos como Escort, Corcel, Del Rey e Belina, e a promessa era de 25% a mais de potência, que faziam o motor CHT 1.6 Fórmula do Escort (MK3) ir de 86 cv para cerca de 108 cv, com garantia de fábrica.
Confesso que não fazia a mínima ideia da existência dessa história, e foi graças ao amigo Paulo Mello que pudemos contá-la aqui no blog. Paulo participou do teste de desenvolvimento do Kit Ishi Turbo, sendo responsável pela parte de resistência, cujos testes eram feitos no saudoso Autódromo de Jacarepaguá, no Rio de Janeiro.
Ele nos contou que os trabalhos tiveram apoio da Ford, e que a turbina era regulada para 0,5 kg de pressão, sendo que na dinâmica do funcionamento, o caracol não forçava a entrada de ar no carburador, mas sim, puxava o ar que entrava nele. Em relação aos testes na pista, a Ford estabeleceu as velocidades que deveriam ser atingidas em cada curva do circuito, como forma de definir a carga (força centrífuga) à qual o motor seria submetido (sobretudo quanto à retomada e aceleração).
Foram contratados dois pilotos, e os tempos de volta não podiam ser mais baixos que 2min48s, sendo que na época, os Dodge v8 da Turismo 5000 chegavam a fazer 2min25s. Essa marca foi estabelecida tendo em vista o desenvolvimento do carro para uso em rua, e não para performance de velocidade final. Mas o "cacete" foi tanto, que depois de dois meses de teste, o monobloco do Escort já dava sinais de cansaço (rachaduras nas longarinas)!
O único ponto fraco identificado na parte mecânica foi a junta de cabeçote, que fez com que fosse desenvolvida uma nova junta pelo fabricante, dotada de lâmina de metal em seu centro. Além disso, fora utilizada a embreagem da utilitária Pampa, e a fabricante Weber deu apoio no desenvolvimento do carburador.
A iniciativa do desenvolvimento partiu do engenheiro Eytan Lubicz (que na época tinha um Ford 1959 v8 turbo, um autêntico hot rod do RJ), que convenceu a diretoria da Ishikawajima do Brasil a criar uma divisão de equipamentos para automóveis de rua. A fabricação de kits turbo pela Ishikawajima do Brasil, que até então só atuava na construção de navios, durou cerca de 10 anos, período em que também foram desenvolvidos equipamentos para o motor AP Volkswagen.
E Paulo ainda nos presenteou com fotos de um autêntico Ford Escort XR3 1986 placa preta, com o kit Ishi instalado, além da vista explodida do projeto do equipamento. Gratidão
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